quinta-feira, junho 30, 2005

A primeira boneca para a Ginga Catarina



Impávida e serena (julgo eu...) às convulsões extra-uterinas, a Ginga Catarina tem desde ontem a sua primeira boneca. Depois de se ver na ecografia das 22 semanas que tudo está bem decidi abrir os cordões à bolsa e comprar-lhe uma coisita. Como é uma menina não resisti a comprar uma boneca linda feita à mão pela Rosa Pomar.

terça-feira, junho 28, 2005

O meu avô Cardoso

Para além dos meus pais, obviamente, um dos familiares que mais me marcou foi o meu avô Cardoso. Digo “um dos” porque algum dia irei escrever também sobre o meu tio D., mas se calhar é preciso passar mais tempo sobre o seu desaparecimento.

Antes de mais, o meu avô Cardoso era também conhecido por mim como o meu avô Bêbado. Apanhava uma bebedeira no dia 1 de Janeiro e ia esticando-a até ao 31 de Dezembro desse ano. Depois tratava de arranjar outra para a substituir. Não era difícil. Até aos anos 70 ele próprio tinha uma taberna, que teve de fechar pelas razões óbvias, e depois vivia numa aldeia em que os dois únicos estabelecimentos comerciais eram tascas…

Morreu no primeiro dia de aulas do meu 1º ano do ciclo, tinha eu 11 anos. Lembro-me como se fosse hoje. A nossa vizinha do 1º andar tinha telefone e subiu as escadas para ir dizer isso à minha mãe. A minha mãe chorou, apesar de lhe ter muitas coisas a apontar. Eu cá não. Sempre foi um avô super meiguinho e sempre me chamou de “netinha”. Mesmo quando estava com um grão na asa e me decidia treinar com perguntas e respostas ao estilo “Quem quer ser milionário” para não dizer Trivial Porsuit. A sua área preferida era a Geografia. Talvez por isso ainda hoje eu tenha um fascínio por viagens, atlas e mapas.

Mas acho que o que ele me pegou foi a vontade de saber sempre mais sobre uma série de coisas, custasse o que custasse. É com orgulho que sei que ele próprio aprendeu a ler e a escrever sozinho só de olhar para os livros e de dar uma vista de olhos naquilo que os próprios filhos aprendiam. E, os seus quatro filhos foram um caso de sucesso escolar… apesar de serem fruto do seu tempo. As filhas só puderam estudar até à 4ª classe mas sempre foram as melhores do concelho. Um dos filhos veio para Lisboa e fez três anos num acabando por ser economista e o outro apesar de ter sido obrigado a deixar de estudar acabou por, com uma vontade de ferro, ter “aproveitado” para voltar a estudar quando ficou desempregando vindo a tirar um 12º ano com um vinte a matemática e acabando contra tudo e contra todos gestão.

O meu avô, contasse, que também era um construtor exímio de bandolins, carroças, grande produtor de belas laranjas e inventor de árvores que davam de um lado laranjas e do outro limões! Para além disso, recordo-me como se fosse ontem, de o ter visto matar à minha frente uma cobra!

No meio disto tudo foi destruído pelo álcool. Sempre me perguntei porquê. Agora já adulta penso que se calhar era porque gostava simplesmente de ficar bêbado. Mas também acho que o foi porque não poderia ter sido outra coisa. Nasceu e cresceu num tempo e num lugar lixados. Penso, sinceramente, que lhe servia de refúgio contra uma existência demasiado pobre para as suas potencialidades.

Cada pequena vitória que sinto na minha vida banal penso nele. Tal como penso nele em cada bebedeira que apanho na vida....

A agulha, o helicóptero e o ninho

Toda a minha vida ouvi falar do Hospital de Santa Maria. Até aos trinta e poucos nunca tinha precisado de ir lá como doente. Fui há pouco tempo. Retenho do monstro a sensação de uma agulha, o som de um helicóptero e a visão de um ninho. No meio de alguma ansiedade e preocupação passei trinta minutos deitada numa cama a repousar depois de ter sido picada por uma agulha que me retirou líquido amniótico. Coisa estranha mas que fisicamente não me provocou dor nenhuma. Depois desse momento tive meia hora para repousar. Tive tempo para tudo. Para ver o futuro à minha frente e para ver a vida a andar para trás. No meio disso tudo comecei a ouvir cada vez melhor o som característico de um helicóptero a aproximar-se. Pensei: quem quer que seja que venha dentro deste aparelho está pior que eu. Eu só estou preocupada. O helicóptero deve ter aterrado porque o deixei de ouvir. Voltei aos meus pensamentos e comecei a ouvir naquele silêncio de hospital um barulhinho bom. Era o som de um piar muito baixinho de pássaro. Olhei para as vidraças, e percebi que não estava sozinha, lá bem no cantinho percebi que uma passarinha tinha construído o ninho para os seus filhotes que esperavam que a mãe lhes trouxesse mais comida. Percebi que no meio daquela monstruosidade, o Hospital respirava vida. Não sei porquê saí dali muito mais calma do que estava à espera.

sexta-feira, junho 24, 2005

A Blimunda conselheira sexual de um táxista

Numa destas tardes em que estavam 35 graus em Lisboa, decidi que tinha de ir tratar de uma questão logística a Campo de Ourique. Apanhei um táxi, coisa que faço muito raramente. Calhou-me na rifa um táxi já velhinho, sem ar condicionado e um táxista de trinta e muitos anos, feínho, e que respondeu polidamente ao meu boa tarde. Mas, como não me consigo aguentar muito tempo de boca fechada acabei por lhe dizer: "Já viu o meu azar, com o calor que está, eu a sonhar com um AC e nada!". Ao que ele começou por responder "É. As mulheres têm sempre qualquer coisa para se queixar...!". Achei uma observação natural e normal mas estava para aí virada e disse "Pois é, pois é. Mas os homens também dão uma ajudinha à coisa." E ele começou para ali com um discurso de "Pois pois. O problema das mulheres é que lhe falta sempre qualquer coisa. Ainda ontem falei com o meu irmão e com ele passa-se o mesmo e com um amigo meu também". E dispara "A menina é casada há quantos anos?", ao que eu respondi "Não, não. Eu não sou casada. Mas não se preocupe que sei quem é o pai do meu filho e só me falta é mesmo um papel." O táxista rejubilou, deu um murro no volante e vociferou: "É isso mesmo! O problema é a merda do papel! Eu estou casado com a minha mulher e esse meu irmão e o meu amigo também e todas elas se queixam do mesmo! A menina não! Está com bom aspecto e não tem ar de se queixar." Eu chegados aqui já não percebia nada e disse a única coisa possível: "Pois...". Ele deve-se ter sentido animado e concluiu: "É que as mulheres nunca querem, está-me a perceber? Ou é a dor de cabeça, ou é a dor de barriga, ou é isto ou é aquilo, e andam para aqui os homens a rebentar... pelas costuras!!!" Houve um momento aqui que pensei que o senhor táxista ía partir para a javardeira mas não. Posto isto, só me restou respirar fundo e dizer-lhe "Ó Sr. Táxista leve a sua mulher a jantar fora, vá de férias, converse com ela". "Ainda mais?! Eu falo fala falo e nada! Nada!Há não sei quanto tempo!", disse ele. Respirei fundo mais uma vez. Evitei não rir do ar desesperado do homem. Contei até dez. E acabei por me ver a dar conselhos sentimentais no melhor estilo Maria. Não tive nenhum desconto. E, não. Não vou dizer aquilo que disse. Ou é muito javardo ou muito patético... ;)
Começo a reparar que tenhp o hábito de acabar os posts com um ;). Será que é excesso de messenger?

Cuecas de gola alta...



Apetece-me começar este post com uma asneirona que começa por um F mas só vou dizer DASSSSSS...!!! Eu que tinha dito que nunca iria usar umas cuecas de gola alta acho que vou ter de voltar atrás na minha palavra pois hoje passei o dia todo agarrada à barriga para suster o peso! Será que a Ginga Catarina vai nascer com 5 kg como o pai e 54 cm como a mãe? Estou lixada... Ainda bem que vou de férias na próxima semana e vou andar por casa da cama para o sofá, e do sofá para a cadeira e da cadeira para o cadeirão. Uma gaja passa a vida a andar por aí toda jeitosa para chegar a este ponto de ter de se submeter ao ridículo de umas cuecas de gola alta. Pior vai ser estendê-las na corda. É imperativo comprar mesmo uma máquina de secar roupa! E é desta que eu me vou despir às escuras... ;)

quarta-feira, junho 22, 2005

Timings imperfeitos...

Estou quase, quase a entrar em desespero. Como é que eu vou conseguir fazer em 2 meses e 20 dias de férias 5 trabalhos de seminários de mestrado? O tempo é manifestamente curto e nem me posso vingar em litros e litros de café e não convém mesmo nada vingar-me em chocolates. Nem convém tomar aquelas cápsulas de Guaraná do celeiro que tomei com a minha amiga, colega e vizinha CA no último ano da faculdade, que nos faziam ficar ainda mais palavrosas que o habitual e mais barulhentas que a nossa condição de altoseixalenses de gema. Vou tentar não me tornar muito esquizofrénica ao dividir o meu cérebro em partes iguais com: por um lado percentis, ecografias, RHs, ácidos fólicos e nausefes; e por outro, Lévinas, Agamben, Benjamins, Burroghs, Haraway, Deleuze.
Vou ter de estabelecer um horário rígido de trabalho! Tipo: levanto-me as 8. Às 9 e meia vou sentar-me ao computador. Antes tento comer e tomar banho e colocar os cremes todos anti tudo que estão lá pela casa de banho e meto-me com o Mandela umas quantas vezes. Às 11 como mais qualquer coisita para a Ginga Catarina não se chatear muito. As 12:45 saio do computador e vou cravar um almoço à família (não sendo apologista deste sistema, numa situação limite como esta de dead lines, é aceitável e eles ficam contentinhos e eu também pela companhia). As 13:30 vou beber à colectividade com os velhotes a única bica permitida do dia. Às 14:00 volto para o computador. De meia em meia hora vou meter-me com o Mandela para ele não se sentir muito abandonado. Passados 2 horas vou ter de ir comer mais qualquer coisita. Lanche. As 19:00 abandono raivosamente o computador! Às 19:30 rego o quintal para não me sentir demasiadamente intelectual. E começo a pensar qual dos 3 ou 4 pratos fáceis de fazer vou fazer para o jantar para me recordar da minha condição de gaja. Ou então o Companheiro trata do assunto porque é um gajo fixe e muuuuuuito moderno. Às 20:00 deixo definitivamente de ser uma intelectual e passo a ser só de esquerda: é a hora que o Companheiro chega a casa...
Obrigado blog por me ajudares a planear a minha vida a partir de Segunda feira!

terça-feira, junho 21, 2005

Mr.& Mrs. Smith



Estou-me a marimbar para os críticos de cinema. Mesmo que digam que este filme é uma porcaria, eu não concordo. Apesar de não ligar nada à parte dos estilhaços, bombas e facas, o casalinho em questão tem tanta química que ir ver este filme é quase afrodisíaco! Claro que depois acordas mas enquanto estás na sala de cinema... faz-me lembrar o Dempsey e Makepeace, o Rhett e a Scarlett, e esses todos. Com tantos canastrões e canastronas que andam por aí, soube-me bem ver este casalinho tão arrumadinho. Claro que isto acompanhado de expressões do vizinho do lado sobre o freak show montijense dos nossos companheiros da sala de cinema. Fogo! Se vamos ao King ouve-se a cassete dos "Intelectuais do c...", se vamos ao Monumental a do "C... esta m... é bué clastrofóbica", se é uma ante-estreia: "Panele... do c...". Para quê sair de casa, quando lá é uma animação? ;)

sexta-feira, junho 17, 2005

O meu bichinho...



quinta-feira, junho 16, 2005

A Ginga Catarina com 18 semanas... dentro da barriga



Depois de alguns sustos, aqui fica a fotografia/ ecografia da Ginga Catarina há duas semanas. Ainda não dá para ver parecenças... Mas, também convém manter algum suspense até ao fim. Acho que lhe vou dizer daqui a uns anos que ontem ela também foi ao funeral do Álvaro Cunhal. Pelo menos ontem já levou com a cassete do Avante e da Internacional. Só falta levá-lá à Festa da Atalaia. Depois disso quando ela nascer e desatar a choramingar ponho-lhe esta cassete e pode ser que ela se acalme ou ouvir estas melodias. Não é isso que dizem os manuais? E agora me lembro que falta pô-la a ouvir o "Chamaram-lhe Catarina, o Alentejo a viu nascer..."....

O funeral do Homem


Antes de mais convém dizer que esta fotografia pertence à edição de hoje do Diário de Notícias. Fica aqui uma imagem numa altura em que parece que as palavras já secaram de tanto terem sido repetidas. Como diz a R., fico contente por ter estado lá neste momento de despedida. De despedida mas também de grande força. Senti que aquele mar de gente se se esforçasse mais um pouquinho no dia a dia poderia alterar algumas coisitas neste nosso pequeno mundo.

terça-feira, junho 14, 2005

Álvaro Cunhal

A TSF tem-me dado muitas boas e más notícias. Na manhã de 13 de Maio soube que Álvaro Cunhal tinha morrido. Acho que chorei como se tivesse morrido uma pessoa amiga. Nestes dias senti que uma parte de mim se tinha ido também. Primeiro foi o Vasco Gonçalves, que era o senhor a quem nós fazíamos adeus ali no meio de uma avenida quando subíamos para a Alameda nas manifestações do 1º de Maio. Lembro-me de ser muito feliz nessas manifestações às cavalitas do meu pai e a abanar a bandeira de Portugal, a fazer adeus ao tal senhor e a cantarolar: “O Povo Unido nunca mais será vencido” e coisas assim.

Uns quantos anos depois, já em plena adolescência e ainda com muita ingenuidade, fui aos Penicheiros a um Comício do PCP onde estava o Álvaro Cunhal. Naquela altura e muitas vezes depois tive a tentação de me inscrever no Partido. Seria a ordem natural das coisas. Lembro-me perfeitamente de o ver sair dos Penicheiros por uma porta lateral com a sua pastinha debaixo do braço e o povo todo a gritar Viva o PCP!.

Até que comecei a trabalhar com comunistas no dia a dia, desde presidentes de câmara, vereadores, assessores, técnicos, mulheres de fotocópias, contínuos, cantoneiros, motoristas, etc, todos eles comunistas numa instituição administrada pelo Partido também. O meu entusiasmo travou. A utopia foi-se. Muito do entusiasmo também. Sai do Barreiro e fixei-me muito mais em Lisboa. Continuei a ser votante, outras vezes preferi o branco, continuei a ir à Festa do Avante e a arrepiar-me ao ouvir a Internacional, o Grândola e o E depois do adeus. Mas, comecei a tomar consciência do outro lado da história...

Já a trabalhar e muito mais distanciada do Partido, uma tarde uma colega diz-me: “Tenho aqui ao telefone o Álvaro Cunhal que quer falar com o responsável, como ele não está, queres tu atender o senhor?”. Tremi. Congelei. Fiquei petrificada e fiz um sinal afirmativo e pedi para passarem a chamada para um gabinete fechado. Respirei fundo. Disse “Estou sim”?. Não me lembro de mais nada. Só sei que no final da conversa o Álvaro Cunhal disse qualquer coisa do género “Muito obrigado” ou “Boa tarde” e eu que me tinha aguentado até aí descontrolei-me e estive para aí um minuto a dizer ao senhor “Eu é que lhe agradeço. Muito boa tarde é para si. O prazer foi todo meu. Ligue sempre que precisar. Gostei muito de falar consigo. Ajudo naquilo que for preciso.” Enfim, fiz uma grande figura de parva! Sei que desliguei o telefone, respirei fundo e liguei para o meu pai. Orgulhosa como no dia em que lhe disse que tinha entrado para a faculdade: “Pai, falei com o Álvaro Cunhal.” Eu sabia que ele, velho comunista também, sem eu ter de dizer mais nada percebia o meu contentamento.

Hoje, já mais adulta, continuo sem ser militante de nenhum partido. Mas se existe partido que me consegue ainda emocionar é este. Ao chorar a morte do Álvaro Cunhal nem choro por ele nem por nós. A sua morte foi natural. O que me inquieta é que eu tive a sorte de ainda ter vivido num tempo em que existiram homens que lutaram para eu ter uma vida melhor e que, indiscutivelmente, o conseguiram. Quando eu nasci existiam homens a lutar contra um Império angustiante, uma guerra colonial estúpida, a ditadura, e condições de vida mais dignas para todas as pessoas. Hoje lutam pelo tacho, por um TDI ou GTI, por um GPS ou por um 3ª geração. Os miúdos que nascerem em 2005 vão ter uma vergonha do caraças ao verem o tipo de pessoas que nos governam agora. Exibem os filhos para conseguirem mais votos. Fogem para o Brasil para não responderem à justiça. Atacam criancinhas. Mudam tão depressa de esquerda e de direita como de gravata. Pedem-nos para apertarmos o cinto mas eles vivem principescamente.

Espero que algo mude.